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Mostrando postagens de 2021

Mais nada

Simples como entregar-se ao ato de existir passivamente em meio a gente que se faz e se desfaz, tragados pelo tempo, pela pressa, pelo movimento, pelo descarte. Dados objetivos submetidos ao olhar que só vê o que for preciso. Mais nada.

Pressa

A precipitação e o descuido, depois a pressa de ver tudo pronto: porque nunca sei o que vai sair da ponta dos meus lápis de cor. 

Gratidão

 Uma para você, outra por você e mais uma, para agradecer.

Surpresa

 Quando os borrões de tinta assumem formas assustadoras.

E o vento

 No pensamento, meus azuis verdejantes e as águas paradas, levemente acariciadas pelo vento que me traz sussurros quase inaudíveis. 

Sábado

 Indiferente ao sábado. Contudo, há festas pelo ar, expectativas, novidades. Então, sejam flores, amarelas, aliviando o fundo cinzento e frio. 

Os salvados

 Penso sempre nos desacertos que cometi: quem sabe? Única explicação que encontro para continuar insistindo nesses enigmas, nelas janelas e gavetas. Talvez porque haja ainda o que descobrir além de nossa morada e o que recolher e engavetar: os salvados à matéria vital.

Inútil espera

O cotidiano não pode ser elaborado. Ele é simples, seja quando tem pressa, seja quando se espreguiça.  Se algo acontece, está além da janela, como a luz, como o vento, como os verdes e os azuis; do lado de dentro, a inútil espera: não vais voltar.  

Vermelhas

 Para que tenhas um dia melhor, caso apareças por aqui. Não precisas dizer nada. E podes colher essas flores vermelhas, que são eternas como a luz que as capturou. 

Sim

 Torres, sim. Longe da terra, mas perto do céu: abstração, meu pensamento, teu passamento. Saudade.

Gravidez

Quando se concebe no espírito, engravida-se de novas ideias...

Simples assim.

 Porque colorir é divertido.

Aves-do-paraíso

 Ao ouvir pela primeira vez que existia um pássaro chamado ave-do-paraíso, eu quis saber como ele era. Achei a imagem e confesso que esperava mais  de um bicho que, afinal de contas, morava no Paraíso, lugar para onde iriam as pessoas boas, ou seja, gente que não pecava. Depois soube, por meu avô Paschoal, que era só o nome da ave que falava em Paraíso, e que isso não significava tratar-se de um ser sobrenatural, que habitava em lugar também sobrenatural. Tive, então, graças ao nome de uma ave e graças ao meu avô Paschoal, uma iniciação verdadeiramente metafísica, respeitadas as devidas proporções. Compreendi, enfim, perfeitamente bem, que o Paraíso era quase a mesma coisa que o tal faz de conta, coisa que estava ao meu alcance fazer acontecer. Compreendi também que, se havia ou não aves no Paraíso, só depois de chegar lá seria possível saber.  Hoje penso que meu avô já sabe como são as aves que existem no Paraíso, pois, naturalmente, é lá que ele deve estar. Eu, to...

Presença

Um não querer que sucumbe à aceitação. Como vida que segue, como dias que passam, mas que, mesmo assim, se fazem aqui presentes, floridos. 

Alegria

Eram doze. Ergueram-se vaidosas buscando os céus, por um instante esquecidas de sua fragilidade. E eis que dessa combinação de fraqueza e pretensão nasceu-lhes a alegria.

De florais e poesias

 E foi assim que eu desordenei o sentido das linhas, para que o fundo não pudesse influir muito na forma. Mas não é o caso. O desenho é sempre o que é, nunca o que seria. No caso, o que me parece importante é que a forma se faz sustentar pelo reflexo, e gosto disso, porque assim se praticam os impossíveis. De resto, meus azuis plenos entre roxos e lilases, ligeiramente rosados, discretamente dourados. Concluído o desenho, tornado luz agora, penso que se o tivesses visto talvez não te agradasse. Nunca soube bem o que preferias e, no fundo, imagino que,  não apreciando poesia, talvez não tivesses também gosto pelos florais. Não sei. Nunca soube e, agora, nunca saberei.

Sutilezas

A santidade nunca é tão sutil quanto o pecado pode ser às vezes.

Exagerei

 É bom colorir. Um pouco mais aqui, um pouco mais ali e pronto! Mais uma vez eu exagerei.

Hibisco

 Havia tantos nos jardins da minha infância. Encantavam-me com seu colorido, mas estranhava que, tão belas flores não tivessem  perfume. Eram flores bonitas mas rebeldes., porque não serviam para enfeitar vasos de flores. Uma vez colhidos, murchavam, tristemente, faziam-se feios, enrugados, escuros. Eu os cozinhava em latas de compota de pêssegos, e extraia um suco roxo, denso, que misturava com água e virava tinta. Brincava assim com essas flores que chamava de Mimos de Vênus,  coisa que se ouvia como se fosse Mimos de Vento, mas que pessoas cultas chamavam pelo nome certo: hibiscos. 

Repentinamente o vento

 Repentinamente o vento abre uma janela na parede, ergue cortinas e quase abre minhas gavetas.

Será?

 Sem precisão. Se é que você me entende.

Desiguais

 Vida e morte, cada uma com a estética que lhe é própria, inerente a cada desigualdade.

Nunca mais outra vez

Pensei comigo, enquanto o lápis corria pelo papel, que estavas bem ali, a olhar as cores, os claros, os escuros, tudo enfim. Cheguei a sentir teu olhar, tua presença, e fiz de conta que sim, que ali estavas, do meu lado, quieto, mas atento, como sempre. Mas logo depois me dei conta de que não era mais sempre, porque é nunca: nunca mais outra vez.  

Por hoje

  No desacerto das cores e na fragilidade do papel, as marcações imprevistas. Seja, todavia, a ideia a prevalecer sobre a forma, desastrada e primária. Que as águas sejam profundas, e que os verdes tenham raízes, em que pese flutuarem sob a luz incerta que precede o anoitecer. 

Quisera

 Quisera poder expressar o que imaginei. Rosas e azuis puros seriam, não fosse o peso das cinzas precipitadas assim, como antevisão de um luto que mesmo passado se lança sempre ao futuro.

Amarelos intrometidos

 Então eu fiz isso tudo correndo. Quase quebrando pontas de lápis, riscando com elas até o desgaste. Mais as tintas depois por cima de tudo, e os brancos naturalmente. Porque deixar os brancos vai te fazer perceber o que não foi dito. Desenho e pinto tudo aquilo que eu não digo: inconfessáveis irracionalidades. Depois de tudo pronto e exposto nessas paredes de luz, compreendo que esqueci das flores, justamente hoje, quando amarelos luminosos se intrometeram por entre os riscos só para confundir as minhas palavras.

Trindades

 Mais uma trindade. Tudo pelo obsessivo número três e outras triangularidades.

A que vieram

 Fizeram-se vermelhas. Porque não controlo nada do que se pinta diante dos meus olhos. E sei bem que, ainda que eu pensasse que seriam margaridas, surgiram-me essas outras até melhores por sinal. E no fim, depois de aquietados pinceis e tintas, depois que tudo se deu por pronto, eu olho para poder ver e adivinhar a que vieram mais essas flores afinal.

Porque eu não sei

 Quem sabe se com linhas menos densas, cores mais leves, cortinas bem abertas, quem sabe? Quem sabe se com essas alterações tudo isso não funciona como deveria e, finalmente, te prestas a vir e a ver as flores que eu crio para o teu olhar. Quem sabe? Te prestas a espiar pela janela, a entrar aqui com o vento, com a luz, com algum som quase rotineiro que me soe familiar. Quem sabe, porque eu não sei. 

Jeito de Sábado

 Para que o sábado tenha jeito de sábado: com sol e com flores.

Sem ressentimentos

 Flores removidas dos vasos e gavetas esvaziadas: sem ressentimentos.

Tempestade

 Uma tempestade de azuis que se precipitam violentamente sobre um céu amarelo. Só para perverter o regime cromático, só para brincar com as cores, só para ver nascer o verde dessa disputa gratuita e inesperada. 

Lugar Nenhum

 Olhando assim, faço de conta que é a lua iluminando uma paisagem que fica em lugar nenhum. 

Apenas uma aquarela

 Pinceladas a esmo, brinquedo, cores puras, cores misturadas, pigmento, água, luzes. Abstração. Mas me ocorre súbito a canção daquela rua que, se fosse minha, eu mandava cravejar com pedrinhas, com pedrinhas de brilhante para o meu, para o meu amor passar. Depois me dou conta de que não há rua, nem brilhantes nem mais amor pra passar. Que é apenas uma aquarela. Nada mais.

Não diria nada, se eu fosse você

 Faria com que o silêncio falasse por mim.

Jardins

Flores. Porque já tive jardins um dia. E neles havia fadas e formigas, abelhas às vezes, e mesmo assustadoras minhocas. Havia até flores nos meus jardins, e tantos mistérios indizíveis e inconfessáveis, milagres que transformavam sementinhas em brotos e brotos em plantas. Jardins dão sentido ao tempo, quando nos ensinam a esperar e a acreditar nas flores que virão um dia.

Não

 Não. Não vou prometer que vou caprichar da próxima vez.

Meus absurdos

 Francamente, nada disso representa qualquer coisa minimamente compreensível. O papel nunca está em branco, e essas coisas aparecem sozinhas. É que meus absurdos nem sempre são de propósito. 

Trindade

 Trindade. Por que não? Mistérios...

Terra firme

 Os limites? Que limites? Limites não há, porque tudo se mescla na paisagem. A luz dissolve, as tintas misturam-se, as sombras recuam, não há verdes nem azuis, mas ainda há alguma terra firme onde pisar.

Quisera

Cortinas fechadas. Mas por trás delas, quem sabe, teu olhar devesse persistir. Porque há luz. Porque há flores aqui. Porque há segredos bem guardados na gaveta. Quisera... E porque há tanto de mim também.  

Adão e Eva

O Paraíso não importa. Os laços, sim.

Sem fim

 Que sejam secos os galhos pelos quais um dia fluiu a seiva. Não menos, porém, pela morte que resseca; não menos, pela morte, porque nela há toda vida que não houve, toda intensidade da promessa, toda ousadia imaginada do que ficou por último: sem fim.

Retrato?

Em meio a traços confusos, reconheço teu olhar.   

Rosas místicas

 Rosas místicas, císticas, encaroçadas e sistêmicas. Caracóis imprevisíveis que invadiram o papel e contagiaram até as dobras do pano. Ordeiras, alinhadas, bonitas.

Girassóis

Dá para dizer que girassóis são um clássico? Acho que sim. Passaram por muitos pinceis e têm até algum mistério. Minha mãe dizia que davam sorte, que traziam alegria. Então penso que uma e outra nunca são demais. 

Desejo

Muitas cores, muitos contrastes, muitos detalhes. Muita força na água que dissolve os pigmentos coloridos, muita espontaneidade. Nenhum projeto, nenhum planejamento, nenhuma direção, exceto meu desejo de que o imponderável possa novamente permear o real, para torná-lo pleno outra vez. 

Em presença da tua ausência

Depois que acontece, e só depois, eu olho e então vejo o que fiz. Não, não há mistérios. Não há estranhas influências. Há apenas a tua ausência, ela mesma, que se torna um ente. Um ente que é. Ser intransitivo obediente à lógica do desespero, que se projeta em premissas, que cria e recria palavras, que combina e recombina verdades. Ente é o ser que é. E tua ausência, portanto, não é um vazio: é a presença dela mesma. Bem assim. Real. Banal. Tão real que até cabe nesta gaveta de onde a escuridão transborda. Diante dela, uma lápide que recorta um pedacinho de céu e flores que, descombinadas, te levo sempre. Até que, qualquer dia desses, possamos finalmente nos encontrar lá em Nunca Mais.

A culpa é do Freud

 Ainda não me livrei da culpa de sujar papel de boa qualidade. Sei que é meio ridículo, mas faço parte da turma que ama papelaria. Fico fascinada com material de desenho: lápis, tintas, canetas. Sou apaixonada por papel em branco. Quando é papel de boa estirpe , reconhecidamente, caros e especiais em suas propriedades, notadamente absorventes, então, o medo de estragar  é imenso. Me culpo quando compro, porque é um luxo dispendioso, e me culpo mais ainda, quando uso. Ainda assim, o bloco de apenas 15 folhas de Canson está no fim. Morro de pena de estragar o papel em minutos, riscando tudo e pincelando furiosamente a tinta tomada às pastilhas de aquarela já quase no fim. Mas são pastilhas comuns. Sonho mesmo com as importadas, obscenamente caras. Um dia, quem sabe... O superego não perdoa: penso que é desperdício, que vai tudo para o lixo, que é rasgar dinheiro e aqueles pensamentos todos que as almas culpadas bem conhecem. Mas depois vem o cretino do id, sempre liberal e ...

Eu sem mim

Noites, madrugadas, palavras que soam como ruídos e ruídos que soam como palavras. Como assim? As teclas agora mesmo que, tocadas, se reorientam nas letras, depois nas palavras, na barra de espaço. Instantes que se seguem, infinitos encadeados que reclamam um sentido. São fluxo, água, vida: fluidez confusa que reclama conceitos com receio de cair na pura abstração. Linhas que se transformam em maçãs, seguramente vermelhas, como garantia de que não se confundam com todo o resto. Um pouco como eu só que sem mim.