Existe algo de sinistro em alguns lugares. Diria que também há algo de sinistro em certas combinações de cores, como, nas melodias, naquelas de certos tons menores que parecem chorar. O sinistro, por sua vez, tomado como substantivo, poderia bem ser uma categoria, — um lugar, quem sabe —, ultrapassando a função acessória que lhe é assinada como simples adjetivo. Afinal, às vezes é preciso extrair de uma palavra tudo o que ela tem a oferecer.
Olho para essa imagem e imagino que atrás dessas montanhas negras está Nunca Mais, a cidade para onde partiste. São montanhas de ferro, imensas, que não se deixam tocar nem em tempos de frio nem de calor. E lá sempre faz muito frio ou muito calor. As águas são profundas e venenosas, para que nada nelas tenha vida. Não são águas mães, mas águas madrastas, águas que abortam em lugar de gerar. O céu, por sua vez, tem fim. Ele não permite que se voe nele, e possui nuvens de cantos quadrados, para machucar quem quer que se atreva a vencer os espaços que ele preserva. O ar é pesado: nele não se respira, vive-se a suspirar. Em Sinistro, não há terra firme. É impossível ficar de pé, e nada lá se equilibra perfeitamente. Tudo isso é Sinistro, categoricamente falando, um lugar que existe, sim, na minha subjetividade. E como posso compreendê-lo, posso descrevê-lo. Posso ainda viver nele, como tenho feito, desde que partiste. Habituei-me a Sinistro. Não há alternativa senão habituar-me a essa paisagem, porque estou convicta de que Caronte, sempre que perde o rumo, passa por aqui, rumo a Nunca Mais.

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